— E atenção para a última notícia: juízes decretam fim da obrigatoriedade do diploma de jornalismo para o exercício da profissão de jornalista.
Conforme o viajante vai acompanhar em instantes, essa foi a última notícia apresentada por João Boiadeiro na Rádio Estação Querida, como ele mesmo havia profetizado pouco antes de tomar sua decisão.
Bem, foi assim que a transmissão acabou, sem mais palavra, se é que podemos desconsiderar aquela mensagem que só o mais absoluto silêncio pode transmitir. Mudo, corri para o estúdio e encarei o locutor por um momento.
— João, o que foi?
— Foi que, para mim, chega.
— Mas o que é que não te agrada?
— Essa vida bandida, essa sensação de foragido, esse peso na consciência. Não suportei nem por um minuto e, já que a montanha veio até mim, peço demissão em meu próprio território, onde sou mais forte.
— Pois trate de me explicar o que é esse bangue-bangue todo.
— Não tenho diploma, portanto não posso mais trabalhar nesta rádio.
— Agora visualizei o filme e o velho oeste. Pois saiba que ladrão que rouba ladrão tem mil anos de perdão.
— Sou bandido frouxo, meio medroso, mea culpa. Jornalista fraco, meio desinstruído, meia boca.
— Ah! Mas na Estação é diferente: temos uma licença poética para atuar em tão nobre área da comunicação social sem diploma.
— Em primeiro lugar, ética é ética em qualquer lugar, inclusive nestação. Ainda que não me falte a ética que eu adquiri, pode ser que me falte a parte que eu não conheci por não ter vivenciado as situações que a desafiariam. Além do mais, falta-me a compreensão dos processos da comunicação, das possibilidades que a tecnologia proporciona, das especificidades de cada veículo...
— Sim, aí pode até haver verdade.
— Então, você concorda: falta-me o diploma para o trabalho em jornalismo.
— Mas quem disse que aqui se faz jornalismo?
— Faz-se o quê?
— O termo é jornalidade. "Ismo" é sufixo de doença se a gente considerar o jornalismo de certas reportagens que são feitas por aí. Mas aqui se faz jor-na-li-da-de!
O viajante de primeira viagem pode pensar que toda essa etimologia foi muita falta de ética da minha parte para convencer a mão-de-obra barata a se manter, digamos, aberta. Quanto a mim, limito-me a convidar o viajante a fazer mais visitas para, eu calculo, certificar-se de que jornalidade é mesmo o jornalismo com a vitalidade da Estação Querida. Quanto ao João...
— É engraçado que tenha decidido parar num momento em que, na pior das hipóteses, a decisão dos juízes o justificaria em seu posto (ainda que involuntariamente, já que o negócio deles é com as grandes corporações de comunicação).
— Bandido que é bandido não perde a insolência. Eis a minha forma de desobedecer aos juízes.
— Mas isso não vai chamar a atenção dos jornais!
— Isso prova que, além do diploma, esses caras também precisam de uma boa surra.
Eu, se fosse trambiqueiro metido a jornalista ou juiz vendido metido a entendedor de comunicação, não encararia um João Boiadeiro com uma brabeza dessas.
Conforme o viajante vai acompanhar em instantes, essa foi a última notícia apresentada por João Boiadeiro na Rádio Estação Querida, como ele mesmo havia profetizado pouco antes de tomar sua decisão.
Bem, foi assim que a transmissão acabou, sem mais palavra, se é que podemos desconsiderar aquela mensagem que só o mais absoluto silêncio pode transmitir. Mudo, corri para o estúdio e encarei o locutor por um momento.
— João, o que foi?
— Foi que, para mim, chega.
— Mas o que é que não te agrada?
— Essa vida bandida, essa sensação de foragido, esse peso na consciência. Não suportei nem por um minuto e, já que a montanha veio até mim, peço demissão em meu próprio território, onde sou mais forte.
— Pois trate de me explicar o que é esse bangue-bangue todo.
— Não tenho diploma, portanto não posso mais trabalhar nesta rádio.
— Agora visualizei o filme e o velho oeste. Pois saiba que ladrão que rouba ladrão tem mil anos de perdão.
— Sou bandido frouxo, meio medroso, mea culpa. Jornalista fraco, meio desinstruído, meia boca.
— Ah! Mas na Estação é diferente: temos uma licença poética para atuar em tão nobre área da comunicação social sem diploma.
— Em primeiro lugar, ética é ética em qualquer lugar, inclusive nestação. Ainda que não me falte a ética que eu adquiri, pode ser que me falte a parte que eu não conheci por não ter vivenciado as situações que a desafiariam. Além do mais, falta-me a compreensão dos processos da comunicação, das possibilidades que a tecnologia proporciona, das especificidades de cada veículo...
— Sim, aí pode até haver verdade.
— Então, você concorda: falta-me o diploma para o trabalho em jornalismo.
— Mas quem disse que aqui se faz jornalismo?
— Faz-se o quê?
— O termo é jornalidade. "Ismo" é sufixo de doença se a gente considerar o jornalismo de certas reportagens que são feitas por aí. Mas aqui se faz jor-na-li-da-de!
O viajante de primeira viagem pode pensar que toda essa etimologia foi muita falta de ética da minha parte para convencer a mão-de-obra barata a se manter, digamos, aberta. Quanto a mim, limito-me a convidar o viajante a fazer mais visitas para, eu calculo, certificar-se de que jornalidade é mesmo o jornalismo com a vitalidade da Estação Querida. Quanto ao João...
— É engraçado que tenha decidido parar num momento em que, na pior das hipóteses, a decisão dos juízes o justificaria em seu posto (ainda que involuntariamente, já que o negócio deles é com as grandes corporações de comunicação).
— Bandido que é bandido não perde a insolência. Eis a minha forma de desobedecer aos juízes.
— Mas isso não vai chamar a atenção dos jornais!
— Isso prova que, além do diploma, esses caras também precisam de uma boa surra.
Eu, se fosse trambiqueiro metido a jornalista ou juiz vendido metido a entendedor de comunicação, não encararia um João Boiadeiro com uma brabeza dessas.
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